Desenvolvido no Laboratório de Tecnologia Química da UnB, material oferece oportunidade de trabalho e renda para comunidades extrativistas da floresta

Foto: Arquivo Pessoal

 

Em 2004, a designer Flávia Amadeu ingressou no mestrado em Artes na Universidade de Brasília para pesquisar novos materiais e wearable computing (tecnologias vestíveis). Durante o curso, ela conheceu a borracha colorida FSA (Folha de Defumação Líquida), que estava sendo produzida por seringueiros da Amazônia, sob orientação do Laboratório de Tecnologia Química (Lateq) da UnB. Além de dispensar a queima realizada nas usinas tradicionais de processamento, a borracha criada no Lateq usa tecnologias simples e de baixo custo, gera poucos resíduos poluentes e oferece aos seringueiros e suas famílias oportunidade de trabalho e renda na floresta, entre outras vantagens.

 

“Eles tinham criado o material, mas não sabiam o que fazer com ele, quais eram as possibilidades de uso dessa borracha. Não havia designers no Lateq”, lembra a pesquisadora.

 

Formada em Desenho Industrial, Flávia conta que, a partir daquele momento, começou a testar a borracha e a aperfeiçoá-la com a equipe do laboratório. “No início, ela tinha um cheiro insuportável. Hoje usamos essências naturais extraídas da floresta em sua composição”, cita. Na época, ela desenvolveu um painel feito do material para uma exposição em São Paulo. Dessa experiência, a pesquisa evoluiu para a confecção de acessórios, como pulseiras, colares e brincos – as Joias Orgânicas. “Coloco tudo no corpo. Essa é a minha relação com o design", explica.

 

A pesquisadora Flávia Amadeu (centro) realiza oficina com artesãs no Acre Foto: Arquivo Pessoal

 

MODA SUSTENTÁVEL – Na volta ao Brasil, após uma temporada na Inglaterra para cursar o doutorado na London College of Fashion, Flávia abraçou o empreendedorismo social. Contratos com duas comunidades seringueiras no Acre acabam de ser assinados. “Isso é bom para todos os que fazem parte da cadeia produtiva”, diz. Para o designer, garante o fornecimento de boa borracha o ano inteiro. Para o seringueiro e suas famílias, oferece melhores condições de vida na floresta.

 

Além de realizar a compra da borracha para criação de suas peças, ela tem apoiado o artesanato local. "Neste ano, estive nos estados do Acre, Pará e Piauí. Espero colocar em prática novas formas de relacionamento com os artesãos. É preciso que eles tenham autonomia e se identifiquem com o que fazem”, acredita. “Já teve artesão que disse assim pra mim: 'Olha o que eu fiz com tal designer, achei lindo, mas eu não me reconheço neste trabalho'", conta.

 

Como caso de sucesso, Flávia cita José Rodrigues de Araújo, o Doutor da Borracha, e sua linha de sapatos. “Com a ajuda do Lateq, dedicação e talento, ele saiu de uma situação de pobreza e se tornou um designer. Hoje, Doutor da Borracha é uma marca. Pra mim, ele é um gênio. Ele tem a produção dele, ensina comunidades e comprou uma área de floresta para protegê-la. A esposa, além de ajudar a produzir, cuida da logística e da comunicação.”

 

Em 2012, José venceu o concurso promovido pelo museu A Casa do Objeto Brasileiro, em São Paulo, com os sapatos artesanais de borracha, na categoria Produção Coletiva. Em 2014, veio mais um reconhecimento, dessa vez internacional, ao ser escolhido para expor em Milão, na Itália. “Quando o trabalho é rentável e é possível viver dos produtos da floresta, a população não vai migrar para cidades, devastar ou trabalhar para grileiros e latifundiários”, ressalta Flávia.

 

Após coleta, o leite da seringueira (látex) é levado para microusinas de processamento onde é misturado com ácido acético, composto vulcanizante, pigmentos e essências aromáticas Foto: Arquivo Pessoal

 

A folha de borracha colorida pode ser produzida em um dia. A secagem é feita no varal Foto: Arquivo Pessoal

 

Folhas prontas para serem comercializadas Foto: Arquivo Pessoal

 

Ela conta que a preocupação com a sustentabilidade econômica e social do trabalho nas comunidades extrativistas aumentou depois de participar de um projeto de preservação da Amazônia em parceria com a WWF UK e a TV Sky. “A celebridade britânica Lily Cole foi a embaixadora da campanha Sky Rainforest Rescue em 2012. Desenvolvemos uma edição limitada de joias que se esgotou em uma semana. Naquele momento, pensei: 'Poxa, fizemos um projeto maravilhoso com a ajuda das comunidades extrativistas da floresta e agora simplesmente vamos embora? Isso não é sustentável'.” Desde então, uma parceria foi estabelecida com a WWF para dar continuidade aos projetos locais.

 

Confira aqui matéria da UnBTV.