Queima dos resíduos gerados pelas fezes, urina e penas de frango de todas as granjas brasileiras poderia gerar energia equivalente a de uma turbina de Itaipu. Descoberta pode agregar valor ao mercado de granjas.

A busca por fontes alternativas de energia e de destinação de resíduos no século XXI deu um importante passo nos laboratórios da Universidade de Brasília. O pesquisador Guilherme Neitzke descobriu que o gás gerado a partir da queima dos dejetos de frangos, em um processo chamado gaseificação, possui valor energético equivalente a 36,22% do óleo diesel. A gaseificação da produção aviária ainda gera adubo orgânico e agrega valor econômico aos resíduos que seriam descartados no meio ambiente.


A cama de frango é uma espécie de forro usada para proteger os pés dos frangos nas gaiolas das granjas. Composta por uma mistura de casca de arroz e gravetos, o material poroso ainda serve para absorver a urina e as fezes das aves, além das penas que se soltam dos animais. Geralmente trocado a cada 250 dias, o material que já foi usado como alimento para o gado não possui uma destinação hoje. “Pelos altos níveis de contaminação, o uso na agropecuária foi proibido”, afirma o pesquisador.    


Nas mãos do engenheiro Guilherme e do professor do Departamento de Engenharia Mecânica da UnB Carlos Gurgel, o que deveria ser um problema tornou-se solução. Durante o mestrado de Neitzke, defendido no início de 2010, a dupla testou o uso do gás gerado pela queima da cama de frango como uma fonte alternativa de energia. E obteve resultados surpreendentes. “O poder energético do material chega à metade do da madeira, comparando a queima dos dois materiais”, revela o engenheiro paranaense.

Segundo maior produtor de carne de frango do mundo, o Brasil chega a gerar 10 milhões de toneladas de cama de frango por ano. Segundo Guilherme, a gaseificação desse total de dejetos poderia gerar até 700 megawatts de energia por hora, o equivalente a uma turbina da usina hidrelétrica de Itaipu. “Com um estudo econômico detalhado e o interesse e investimentos por parte do Estado e de produtores, a conversão dos dejetos em energia pode, sim, ser uma realidade no país”, defende o pesquisador da UnB.


EFICIÊNCIA –
 A gaseificação é um processo de conversão termoquímica. Em outras palavras, trata-se da submissão do material coletado a temperaturas que beiram os 1000 ºC para sua conversão em gás. “A cama de frango é prensada e colocada em um reator. Após a queima ocorre a purificação do biogás, o resfriamento e por último uma filtragem para retirar o alcatrão, que é prejudicial para o motor”, resume Guilherme. O pesquisador usou cerca de 300 quilos de cama de frango para testar o método.


Os benefícios da gaseificação não param por aí. Análises químicas realizadas por pesquisadores colaboradores apontaram que as cinzas geradas após a queima são ricas em substâncias como Fósforo e Potássio e podem ser usadas como adubo orgânico. “A exposição a altas temperaturas elimina qualquer possibilidade de contaminação do material e permite uma destinação ambientalmente mais correta à cama de frango, que não pode ser descartada in natura”, explica o orientador do estudo, Carlos Gurgel. 


O professor destaca ainda o ineditismo do estudo no país. “Fizemos uma extensa pesquisa bibliográfica e não encontramos nada semelhante no Brasil”, conta Gurgel. Citada em importantes congressos internacionais de combustão, a pesquisa que contou com a colaboração de vários professores da UnB representa uma nova ferramenta na luta por um modelo de desenvolvimento mais sustentável e socialmente mais justo. “A ciência tem um papel crucial na busca por esse novo caminho”, acredita Guilherme.