Estudo mostra que a escolha por alimentos saudáveis depende de propagandas veiculadas na televisão. Concorrência entre anúncios é desleal: 96,7% deles são de frituras e enlatados.

Durante um final de semana, crianças chegam a passar 11 horas por dia em frente à televisão. Pesquisa do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília mostra que a propaganda pode influenciar na escolha do cardápio alimentar dos pequenos. De acordo com o estudo, meninos e meninas que assistem a anúncios sobre alimentos gordurosos na TV, como hambúrguer, refrigerante ou batatas fritas tendem a optar por esses alimentos. O mesmo acontece quando a  garotada é exposta a propagandas com comidas saudáveis. O problema é que a disputa entre os dois tipos de alimento é desleal. Frituras, enlatados, doces e produtos de consumo imediato representam 96,7% da publicidade de alimentos no Brasil.


Produzida pela professora Márcia Ueda, a dissertação de mestrado O efeito da publicidade de alimentos saudáveis e não saudáveis sobre as escolhas alimentares de crianças, analisou o comportamento de 28 crianças, entre 7 e 9 anos, divididas em três grupos, dois com 12 crianças cada e um com apenas quatro. A pesquisadora exibiu, em dias diferentes, vídeos com imagens de alimentos saudáveis e não saudáveis e depois apresentou às crianças figuras com 36 tipos de comida para identificar as escolhas que faziam.


Cada grupo de 12 crianças assistiu cinco vídeos em cinco dias diferentes, o primeiro sem alimentos e os outros quatro com imagens de comidas, sendo dois com alimentos saudáveis e dois com não saudáveis. Para um grupo, Márcia exibiu primeiro os alimentos saudáveis, em duas sessões seguidas, em dias diferentes, depois de mostrar o vídeo neutro. No segundo grupo, ela mostrou primeiro os alimentos não saudáveis, também em duas exibições e após o vídeo neutro. Depois de cada sessão, Márcia mostrou as figuras às crianças.


Depois de assistirem o vídeo neutro, a média de escolha de alimentos saudáveis pelas crianças foi de 60%. Após a segunda exibição do filme com alimentos saudáveis, a média subiu para 70%. "A variação foi pequena, mas mostra que a presença de vídeos diferentes fizeram com que as crianças modificassem suas escolhas", explicou Márcia. Depois disso, a pesquisadora deu início às sessões de vídeos não saudáveis. Após a segunda exibição, a média de escolhas das crianças por alimentos saudáveis voltou a ser de 60%.


Com o outro grupo de 12 crianças, Márcia fez o contrário: exibiu primeiro os vídeos não saudáveis, sempre após o vídeo neutro. Enquanto só tinham visto o vídeo neutro, a média de escolha das crianças foi de 60%. Com as imagens de comidas gordurosas, caíram para 50%. “Com esse estudo podemos trazer uma nova contribuição para o debate desse tema. Ela pode influenciar nas escolhas de hábitos não saudáveis. Isso é preocupante porque as crianças passam muito tempo em frente à televisão”, afirma Márcia.


O efeito da propaganda na alimentação de crianças e jovens é um dos temas que serão discutidos durante a IV Jornada de Alimentação Escolar, que acontece na UnB a partir desta quinta-feira.


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EXEMPLO -
Das crianças que participaram da pesquisa de Márcia, 71% assistem à televisão enquanto almoçam. Márcia recomenda que os pais sejam mais rígidos e procurem estabelecer rotinas saudáveis para as crianças. “Os pais são responsáveis por disponibilizar o alimento. Eles precisam dar o exemplo e consumir alimentos ricos em vitaminas e minerais. É fundamental diminuir o tempo em frente à televisão. Trocar os desenhos por uma atividade é uma opção”, avisa. A Sociedade Americana de Pediatria recomenda que as crianças assistam a filmes ou a televisão por no máximo duas horas por dia. 


A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou que as empresas indicassem em suas propagandas se o alimento ou a bebida possui quantidades elevadas de açúcar, sódio, e gordura trans e saturada. A ideia é que as propagandas alertassem o consumidor sobre os prejuízos que determinados alimentos podem causar à saúde. Mas a Justiça Federal suspendeu a resolução alegando que a Anvisa não pode legislar sobre o assunto.


Márcia acredita que a medida significa dar um passo para trás. Ela sugere que proibir a utilização de personagens de desenho animados em propagandas de alimentos prejudiciais à saúde e determinar horários para que as propagandas sejam veiculadas são medidas importantes para cuidar da saúde das crianças. “Sei que várias pesquisas estão sendo feitas e existem órgãos de proteção à criança que vão pressionar para que a desproporção das propagandas seja diminuída”, afirma.