Ao transformar seu estabelecimento em centro irradiador de cultura, dono de açougue causa impacto na capital.

Victor Pires/Facto Agência

Por meio de revisão bibliográfica, entrevistas com o empresário Luiz Amorim e depoimentos de pessoas da cidade sobre as iniciativas culturais do açougue, a pesquisa de Maria Inês investiga se essa prática cultural também é motivadora de turismo. "A ideia é trazer ao debate a dimensão social e cultural do turismo em sua estreita relação com a cidade e com a cidadania", afirma a pesquisadora.Patrimônio cultural de Brasília. Assim a pesquisadora Maria Inês Adjuto Ulhôa define o saber-fazer do açougueiro Luiz Amorim, proprietário do Açougue Cultural T-Bone, localizado na quadra comercial 312 da Asa Norte, em Brasília. Em dissertação de mestrado profissional do Centro de Excelência em Turismo (CET) da UnB, Maria Inês analisa os diversos aspectos que envolvem a transformação inusitada de um açougue em lugar de cultura. O trabalho foi defendido em junho deste ano.

 

Segundo Maria Inês Ulhôa, o comerciante transforma as ruas da capital em lugares culturalmente significativos e promove o "turismo cultural e cidadão", em que os beneficiários das ações de Amorim - os habitantes de Brasília - passam a enxergar a cidade como palco de opções turísticas. O turismo gerado pelas ações do empresário é democrático, segundo a pesquisadora, e atinge pessoas das mais diversas formações.

 

Na dissertação, a autora destaca o aspecto emancipador da cultura, característico do projeto. Há quase duas décadas, Luiz Amorim disponibiliza estantes de livros em seu estabelecimento para quem quiser pegar exemplares emprestados, sem burocracia, e devolvê-los quando quiser. Além disso, promove diversas atividades culturais no açougue e é responsável pelo projeto Parada Cultural, que instala livros e terminais de internet em paradas de ônibus. "Brasília é privilegiada por nela habitar esse sujeito histórico, que promove tal ação individual", afirma Maria Inês Adjuto Ulhôa.

 

 Victor Pires/Facto Agência

Maria Inês também enfatiza o caráter contra-hegemônico do açougue cultural, ao contestar a regulação social dominante. Para a autora, o fazer cultural do açougueiro "desmonta o senso comum e reinterpreta a realidade, ao criar um sentido novo para o seu açougue e revolucionar a interpretação que se dá às ações patrimoniais existentes".Para a pesquisadora, essas promoções de eventos gratuitos (shows musicais, debates, saraus de poesia) e o projeto Parada Cultural provocam alterações tanto na vida das pessoas que usufruem dos produtos culturais, quanto na do empresário e da cidade. Uma das mudanças relacionadas à população se refere à facilidade de acesso aos livros. A iniciativa movimenta cerca de mil livros por dia e 300 mil por ano na cidade.

 

O interesse da estudiosa por Amorim, a quem se refere como “sujeito revolucionário”, surgiu da admiração pelo trabalho do açougueiro. Ela acompanha as atividades do T-Bone desde a fundação, em 1994. Luiz Amorim diz ter ficado contente por ser motivo da pesquisa e fala sobre o início das ações culturais: "Busquei na filosofia grega inspiração para promover a arte como fonte de transformação e questionamento". Para ele, depois de muitos anos, é possível ver a boa aceitação do público com relação ao seu trabalho.

 

A dissertação Entre carnes e livros: a arte plural de um açougue e sua apropriação como patrimônio cultural, de Maria Inês Adjuto Ulhôa, está disponível no Repositório Institucional da Universidade de Brasília (UnB). Clique aqui para acessar o documento.