Análise comparativa de traduções brasileiras da obra Of Mice and Men aponta desafios impostos pelo sotaque e expressões regionais.

O livro Of Mice and Men (Ratos e Homens) é um dos mais importantes romances produzidos nos Estados Unidos. Pesquisa da UnB mostra como três diferentes traduções da obra para o português lidam com o sotaque e os termos caipiras do Georgie e Lennie, os protagonistas. Escrito por John Steinbeck, o romance fala da vida dura nas áreas rurais durante a Grande Depressão, contando as dificuldades dos dois trabalhadores rurais que sonham em ter sua própria terra. “A oralidade no texto de Steinbeck é um inglês marginalizado, caracterizado por desvios da gramática normativa”, afirma o pesquisador Johnwill Costa Faria, mestre em Linguistica Aplicada pela UnB.

As traduções selecionadas pelo pesquisador foram feitas por três escritores brasileiros em diferentes épocas – Érico Veríssimo, em 1940; Myriam Campello, em 1991; e Ana Ban, em 2005. A discussão tomada como base para o estudo foi a conveniência de se tentar ou não reproduzir nas traduções as características da linguagem dos personagens. “Por um lado, se o tradutor corrige os desvios da gramática normativa, ele anula os efeitos que enriquecem os personagens e a história. Por outro, se o tradutor tenta imitar essa linguagem ele acaba produzindo algo exótico, não muito natural”, avalia Johnwill.

Érico Veríssimo apresenta uma linguagem mais polida para as personagens. Myriam Campello trata intermediariamente a linguagem – nem tão formal, nem tão marginalizada –, enquanto Ana Ban utiliza uma espécie de “dialeto caipira” brasileiro.

Segundo Válmi Hatje-Faggion, professora de Estudos da Tradução que orientou Johnwill, os tradutores têm uma certa liberdade, embora exista no Brasil uma tradição literária. “Existem os projetos de tradução onde há uma consciência do que vai acontecer com as linguagens características. É o que faz com que na obra escolhida existam variações de regionalismos a cada trabalho”, esclarece Válmi.

LINGÜÍSTICA – De acordo com o pesquisador, é preciso discutir que tratamento deve ser dado à linguagem representativa da fala na tradução. O tradutor precisa não só verter o texto para o português – é necessário deixar claro para uma outra cultura a linguagem característica regional, como por exemplo, a do Goiás. Outros desafios foram identificados durante o estudo, como a tradução de nomes próprios carregados de algum significado especial.

Apesar da “tradução perfeita” ser impossível, Johnwill reforça a importância de se conferir a riqueza da tradução e seus efeitos. “Não se trata de traduzir dialeto por dialeto, mas sim apresentar uma linguagem que apresente os marcadores essenciais das expressões, de acordo a função que ela exerce na história”, conclui o pesquisador.