Alunos do Instituto de Artes (IdA) transformam bitucas de cigarro em papel e produzem o próprio material de trabalho. Todo o processo é feito dentro de laboratórios da Universidade

Foto: Nicolau Ferraz/Agência Facto

 

O número de fumantes adultos no mundo, em 2016, era de 1,1 bilhão, segundo dados levantados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Cada fumante descarta 7,7 bitucas de cigarro por dia em média, de acordo com informações da Autoridade para Condições de Trabalho (ACT). Vale ressaltar que uma parte considerável do descarte de bitucas não é feita no lixo, o que significa que a preocupação relacionada à saúde daqueles que consomem cigarros ainda é grande, porém, não é mais a única.

Pastas de celulose feitas com filtros não fumados (à esquerda) e com bitucas fumadas (à direita).
Pastas de celulose feitas com filtros não fumados (à esquerda) e com bitucas fumadas (à direita). Foto: Nicolau Ferraz/Agência Facto

 

Na Universidade de Brasília, os alunos que realizam pesquisa científica no Laboratório Experimental de Materiais Expressivos do Instituto de Artes (LEME/IdA) fazem sua parte para minimizar o problema e ajudar a diminuir a poluição urbana. Sob orientação da professora Thérèse Hofmann, doutora em Desenvolvimento Sustentável, eles produzem diversos tipos de materiais, inclusive a partir da reciclagem de bitucas de cigarro. “Ensinamos aos alunos o resgate dos materiais. Então, eles aprendem a fazer tinta, giz de cera, giz pastel, papel, pincel e instrumentos que eles vão usar depois nas aulas de artes visuais”, afirma a docente.


Thérèse, junto ao egresso Marco Antônio Duarte e ao professor Paulo Suarez, do Instituto de Química (IQ), registrou a patente da reciclagem de filtros de cigarro em 2003. O projeto começou quando Marco Antônio, que foi aluno de Biologia, propôs como ideia para o trabalho final da disciplina Materiais em Arte I algo que envolvesse sustentabilidade. Assim, iniciaram a pesquisa e desenvolveram o método sem precedentes.


Em 1996, também já havia sido desenvolvida, durante as aulas, uma tecnologia para reciclar papel-moeda descartado pelo Banco Central – e essa foi a primeira patente da professora. Entretanto, o trabalho com a reciclagem de bitucas, que era de graduação, consolidou-se e desdobrou-se para a iniciação científica.

Recipiente utilizado para cozinhar a mistura de filtros com água e produtos químicos.
Recipiente utilizado para cozinhar a mistura de filtros com água e produtos químicos. Foto: Nicolau Ferraz/Agência Facto

 

PROCESSO – O primeiro passo da pesquisa foi distribuir caixas pelo campus Darcy Ribeiro e outros locais a fim de incentivar o descarte correto do lixo e facilitar a coleta do material. Após o recolhimento das caixas, é feita a separação das bitucas, já no LEME, pois normalmente há outros objetos misturados.


Inicia-se, então, o processo de cozimento, que é o mais demorado – pode durar até dez horas. Depois, as bitucas, que também podem ser filtros de cigarro não fumados, são colocadas em um recipiente de aço inox e misturadas com água e produtos químicos, gerando pasta de celulose. Por fim, ela é deixada ao sol para secar até formar um bloco seco, que na sequência será batido em um liquidificador com água para se transformar em papel.

O bolsista João Victor, aluno de artes visuais, sente-se aliviado com a pesquisa desenvolvida com bitucas: “nunca pensamos para onde vai tudo isso”.
Bolsista João Victor: “nunca pensamos para onde vai tudo isso”. Foto: Nicolau Ferraz/Agência Facto


Todo o trabalho é feito no Laboratório Experimental de Materiais Expressivos e no Laboratório de Papel Artesanal, ambos localizados na Oficina de Maquetes e Protótipos do IdA.


O aluno de Artes Visuais João Victor Silva Araújo conheceu o projeto e a oficina por uma amiga que trabalhou muitos anos com Thérèse no LEME. “Ela falou a respeito e me interessei. Procurei a professora e consegui uma bolsa aqui”, lembra.


Para ele, o trabalho feito no LEME é importante também por conscientizar o público a descartar o lixo corretamente. “Estamos sempre pensando em consumir as coisas, em passar adiante, mas nunca pensamos para onde vai tudo isso”, reflete o estudante, que se indigna: “Como o pessoal pode descartar assim, muitas vezes sem cuidado e misturando com chiclete? A mentalidade de só descartar e não pensar em como descartar ainda persiste”. João Victor diz que se sente aliviado ao conviver com pessoas que pesquisam como que isso pode mudar.

Capas de caderno produzidas a partir da reciclagem de bitucas.
Papel produzido nos laboratórios do IdA vira capa de caderno e outros materiais de papelaria. Foto: Nicolau Ferraz/Agência Facto


COMERCIALIZAÇÃO – De acordo com a professora Thérèse Hofmann, o material produzido nas aulas pode ser comercializado, mas os responsáveis pelo projeto preferem trabalhar com parcerias.

 

“Temos preferido trocar. Fazemos papéis para a ENAP [Escola Nacional de Administração Pública] e ela dá em troca água sanitária ou outros materiais que podem ser usados no laboratório”, exemplifica a docente.

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