Pesquisa da UnB revela que 30,9% dos programas regionais de TV são do Nordeste e o SBT é quem mais exibe produções locais.

Com o menor número de emissoras regionais em relação a sua extensão territorial, o Nordeste é a região brasileira que mais reserva espaço na televisão aos programas com temas locais. É o que mostra pesquisa da Universidade de Brasília (UnB), apresentada no último dia 9, na Faculdade de Comunicação.


Dos 1.329 programas regionais produzidos por emissoras afiliadas às grandes redes de televisão pública e privada, relacionados no estudo, 30,9% são da região Nordeste, contra apenas 13,5% do Sudeste, a região com a menor produção regional. O Centro-Oeste aparece no estudo com 24,3% dos programas, o norte com 15,8% e o Sul com 15,6%. A pesquisa reacende uma discussão que se arrasta há duas décadas no Congresso Nacional, a regulamentação do Artigo 221 da Constituição Federal, que obriga as emissoras de rádio e televisão do país a veicularem cotas mínimas de programação regional.

Tese de doutorado da professora Verônica Dantas Meneses, da Universidade Federal do Tocantins, sob a orientação da professora Tânia Siqueira Montoro, a pesquisa selecionou os programas de 192 emissoras afiliadas a três grandes redes comerciais de televisão, Globo, Record e SBT, e uma pública, a TV Brasil. Do total de 1.329 programas relacionados pela pesquisadora, 74% foram produzidos por emissoras ligadas às redes comerciais, o equivalente a 983 produções. Os 26% restantes são de redes afiliadas à TV Brasil, um total de 345 programas.

Dentre as emissoras comerciais com o maior número de programas locais está o SBT, com 27,7% de programação regional. A Rede Globo é a que menos reproduz a cultura regional, com 22,2% dos programas enumerados na pesquisa.


A pesquisadora acredita que o Nordeste concentra a maior parte dos programas regionais por estar distante das sedes das emissoras a que estão vinculadas. “Os programas nacionais, que são produzidos e distribuídos pelas grandes emissoras, representam a cultura da própria região onde estão localizados, o Sudeste, daí porque a produção local é pequena”, afirma.

A pesquisa analisa o conteúdo dos programas locais selecionados e conclui que a programação local, além de variada, não é mera reprodução das grandes emissoras. Os programas refletem a identidade e a cultura das regiões onde são veiculados. Dos 1.329 programas identificados no estudo, 49,8% são noticiários e 37,8% de entretenimento. Apenas 2,4% são programas educativos. “O Brasil tem uma identidade cultural pautada na diversidade. Essas expressões culturais precisam estar na comunicação, mas não basta regionalizar”, comenta a secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, Jandira Feghali, autora do projeto de lei, atualmente no Senado Federal, que regulamenta as cotas de programação regional nas TVs.

A pesquisadora constatou também que a TV pública tem um conteúdo local mais diversificado. “A TV pública trabalha muito mais com parcerias, programas independentes, embora no SBT isso também aconteça. Mas na emissora comercial, esses programas são mais publicitários, de festas e divulgação de eventos”, conta. "As temáticas culturais e o fomento à produção audiovisual também estão mais presentes na TV pública", completa.

Para chegar a este resultado qualitativo, a pesquisadora selecionou oito programas regionais, dentre os 1.329 relacionados no estudo, em cada um dos seguintes estados: Amazonas, Tocantins, Goiás, Pernambuco, Sergipe, Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul.

O espaço reservado à programação regional nas emissoras de rádio e televisão é alvo de polêmica há 20 anos no Congresso Nacional. O projeto de lei nº 256, de 1991, de autoria da ex-deputada Jandira Feghali, obriga as emissoras a reservar, em sua programação diária, uma quantidade mínima de tempo a programas culturais, artísticos, jornalísticos e independentes totalmente produzidos e emitidos no local de sua sede. A proposta regulamenta o artigo 221 da Constituição Federal.

Aprovado na Câmara em 2003, o projeto exige 22 semanais de programação regional, no caso de áreas geográficas com mais de 1,5 milhão de residências com televisores, 17 horas semanais naquelas com menos de 1,5 milhão de domicílios com aparelhos de TV, e 10 horas semanais para as emissoras que atendem localidades com menos de 500 mil residências com televisores. As emissoras de televisão também deveriam reservar pelo menos 40% do total de horas à veiculação de produção independente, o ponto mais controverso da proposta, segundo a ex-deputada Jandira Feghali, hoje secretária municipal de Cultura do Rio de Janeiro.

No Senado desde 2003, o projeto ainda aguarda aprovação. O relator da proposta na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informação, senador senador Papaléo Paes, deu parecer favorável em julho do ano passado, mas, poucos dias depois, pediu reavaliação de seu voto. Por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que ainda “não tem opinião formada sobre o assunto”.

Jandira Feghali argumenta que houve uma “deslealdade” na discussão do projeto no Senado. “Nós fizemos concessões, ouvimos todos os lados. As mesmas entidades que sentaram conosco na Câmara e aprovaram o projeto de lei por unanimidade são as que estão impedindo a matéria de ter seguimento no Senado”, afirma.

A deputada Luiza Erundina (PSB), que participou ativamente da discussão da proposta, acredita que a ausência de posicionamento dos parlamentares está relacionada a interesses pessoais. “Infelizmente, quem vota essas matérias são parlamentares detentores de outorga dos meios de comunicação, o que é uma ilegalidade”, diz. A deputada afirmou que o tema é tão importante que foi tratado na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada no ano passado, em Brasília.