Artigo publicado por quatro pesquisadores da UnB apresenta a descoberta de um novo fóssil de crocodilomorfo, pertencente a um grupo amplamente conhecido no Brasil e na África, que coexistiu com dinossauros e outros vertebrados durante o período cretáceo. Trata-se de uma espécie até então inédita, denominada Thilastikosuchus scutorectangularis.
A identificação da nova espécie baseia-se em fósseis recuperados na região de Campo Azul, no estado de Minas Gerais. A descrição detalhada desse exemplar foi publicada na conceituada revista científica Journal of Vertebrate Paleontology. A pesquisa foi conduzida sob a liderança do professor Rodrigo Santucci, do campus UnB Planaltina, integrando a tese de doutorado de Joyce Celerino, do Instituto de Geociências (IG).
O estudo contou ainda com a colaboração dos pesquisadores Daniel Martins dos Santos e Ricardo Lourenço, que também assinam o artigo. Segundo os autores, este registro destaca-se como um dos exemplares mais completos e antigos deste grupo de crocodilomorfos conhecidos até o momento.
Além disso, o fóssil é notável por apresentar uma morfologia dentária que se diferencia significativamente dos jacarés e crocodilos modernos. Tal padrão dentário, mais semelhante ao de mamíferos, aparece em espécies de crocodilomorfos fósseis que desenvolveram hábitos herbívoros em estágios avançados do período cretáceo.
“Estávamos coletando costelas de um dinossauro saurópode quando percebemos ossos pequenos e inteiros que não pertenciam ao mesmo animal”, comenta Santucci. “Só depois percebemos que se tratava de outro animal. Para se ter uma ideia, as costelas desse crocodilomorfo fóssil medem uns três centímetros de comprimento”, conta surpreso.
Joyce lembra que o fóssil chegou a ser classificado como mamífero. “Só depois da minha defesa de mestrado, quando comecei a preparar o material com mais cuidado, apareceu o crânio. Foi aí que percebemos que era um crocodilo e não um mamífero, como indicado na caixa”, relata. Ela explica que a estrutura do esqueleto e o padrão dentário foram determinantes para a identificação.

O espécime recentemente descrito chama a atenção por apresentar dentição heterodonte, caracterizada pela presença de diferentes tipos de dentes, tais como caniformes, incisiformes e molariformes. “Esta característica indica que o animal não apenas arrancava pedaços de alimento, mas também os mastigava antes da deglutição”, destaca o professor.
“Ainda é cedo para dizer que ele tinha hábitos herbívoros ou onívoros, mas o que sabemos agora é que ele está na base da evolução de um grupo de crocodilomorfos que desenvolveram o hábito herbívoro”, salienta. Assim, o novo crocodilomorfo seria um antecessor das espécies abordadas na edição 28 da Revista Darcy, que apresentou a descoberta de crocodilomorfos herbívoros.
A rocha onde o fóssil foi encontrado data da primeira metade do cretáceo, entre 120 e 110 milhões de anos atrás. As análises mostraram que a espécie pertence à família Candidodontidae, e é a mais antiga entre os crocodilomorfos chamados de notossúquios. Isso fortalece a tese de que este grupo teve sua origem na área que atualmente engloba o Brasil e o norte da África, regiões conectadas antes da separação dos continentes.
A equipe de pesquisa planeja realizar análises adicionais, tanto químicas quanto anatômicas, com o intuito de aprofundar o entendimento sobre a dieta e o comportamento do Thilastikosuchus. Além disso, modelos tridimensionais do fóssil estão sendo preparados para exibições em eventos educativos e exposições. “Apesar de pequeno, ele é um dos fósseis mais completos do grupo já encontrados no Brasil e mostra que ainda temos muito a descobrir sobre a fauna do cretáceo”, conclui Joyce.
A descoberta complementa investigações anteriores lideradas por Santucci sobre crocodilomorfos herbívoros, abrangendo grupos como os Sphagesauridae e o Baurusuchus. Esses estudos têm contribuído significativamente para a reconstrução histórica da diversidade desses répteis extintos.