Estudo aponta que o sorriso é o componente de maior importância para beleza do rosto masculino. Cantos dos lábios ascendentes, largura de dentição e ausência de espaço entre os dentes são características que se destacam na avaliação

 

Os dentistas Virna Patusco, Jorge Faber e Carla Carvalho estudam aspectos estéticos e funcionais relacionados ao sorriso. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB
Os dentistas Virna Patusco, Jorge Faber e Carla Carvalho estudam aspectos estéticos e funcionais relacionados à face. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB

 

A beleza está nos olhos de quem vê. Será que o ditado popular é mesmo confiável? Segundo pesquisa realizada na Universidade de Brasília, o que é belo pode ser atestado cientificamente. A conclusão, que não considera a influência que um vínculo afetivo pode ter na percepção da beleza, está no artigo O sorriso prevalece sobre outros componentes da estética facial masculina (em tradução livre), realizado em parceria com a Universidade Federal de Goiás (UFG).

 

De acordo com o estudo, o sorriso é o componente de maior impacto em rostos masculinos sorridentes, contribuindo com 38% da beleza nestas faces. Em seguida, o que dá charme à face são os olhos, responsáveis por 14% desse escore de beleza. Já a região do queixo e o nariz contribuem com 9% e 2%, respectivamente.

 

“Esses quatro componentes conseguem explicar sozinhos 63% da beleza facial, configurando um bom modelo preditivo”, comenta o orientador do estudo e pesquisador colaborador no Programa de Pós-Graduação em Odontologia da UnB, Jorge Faber. De acordo com ele, o percentual restante pode ser explicado por variáveis que não foram analisadas, como cabelo, textura da pele e aspectos volumétricos do rosto.

 

Uma alteração significativa acontece nas faces sérias. Nelas, a maior contribuição para a beleza é dada pelos olhos, com 22%, seguidos pela boca, com 18% e por queixo e nariz com, respectivamente, 8% e 2%. Segundo a dentista Virna Patusco, coautora do estudo, boca e olhos exercem esse importante papel porque são os principais centros de comunicação da face. “Pelos olhos é possível perceber, por exemplo, se alguém está concentrado ou com raiva. Pela boca e sorriso são manifestadas emoções positivas, como alegria, amizade, simpatia e sociabilidade.”

 

Jorge Faber defende a importância da temática. “A beleza, às vezes, é associada a algo de pouco valor ou fútil. Entretanto, há evidência sólida de que ela está muito relacionada à qualidade de vida do indivíduo – o que, em última análise, é o pano de fundo deste trabalho.” O pesquisador destaca a inovação apresentada pela pesquisa. "Não encontramos na literatura trabalhos que mensuram a contribuição individual dos subcomponentes faciais para a beleza. Esse é o ganho do nosso estudo”, avalia. O artigo foi publicado na revista The Journal of the American Dental Association (JADA).

 

Segundo o pesquisador, o objetivo do estudo não é reforçar padrões de beleza, mas dar respaldo científico a profissionais de saúde. "É importante que os tratamentos estéticos e terapêuticos não estejam baseados na intuição ou bom senso do profissional, mas contem com tomadas de decisão embasadas cientificamente e pacientes sempre muito bem esclarecidos.”

 

METODOLOGIA – A amostra da pesquisa reuniu 86 homens, de 19 a 30 anos. Foi pedido aos participantes que sorrissem enquanto suas faces eram fotografadas frontalmente. O uso do cefalostato (instrumento para manter a cabeça imóvel) e de uma esfera de calibração posicionada sobre a testa de cada indivíduo foi essencial para garantir a padronização das imagens.

 

Além disso, os registros foram ajustados por meio de programa eletrônico, cortados no mesmo tamanho e convertidos em escala de cinza, de modo que a cor da pele não apresentasse grande interferência na análise dos atributos. Além da foto completa da face, foram produzidas imagens com recortes padronizados dos subcomponentes faciais a serem analisados – como olhos, nariz, boca e queixo.

Imagem ilustra o padrão das fotografias que integraram a pesquisa. Fonte: uso cedido pelos pesquisadores.
Imagem ilustra o padrão das fotografias que integraram a pesquisa. Imagem: Reprodução 

 

Uma amostra de 15 mulheres, com idade entre 20 e 60 anos, analisou as fotografias por meio de um site desenvolvido para esse fim. As imagens foram apresentadas em ordem aleatória e acompanhadas de perguntas como: “Quão bonita você considera esta face?”, “Quão bonitos você considera estes olhos?”. As avaliadoras deram notas de 0 (não bonito) a 10 (muito bonito), de acordo com sua percepção da beleza do rosto ou do subcomponente analisado.

 

É importante ressaltar que as fotos dos subcomponentes foram apresentadas aleatoriamente e não após a exibição do rosto ao qual pertencem, para não haver influência do todo sobre as partes. “Um nariz feio pode parecer bonito analisado no conjunto de uma face que tem lindos olhos. Buscamos zerar essa influência distribuindo as imagens aleatoriamente”, explica Jorge Faber.

 

Outra frente de trabalho foi a análise morfométrica: a partir das fotografias foram tiradas medidas das faces e de seus subcomponentes, com uso de programas computacionais. Entre as medições estão: largura dos olhos; posição das pupilas entre si; comprimento das sobrancelhas e o ápice de seu arco; largura e comprimento do nariz; largura do sorriso; largura e volume dos lábios; tamanho dos dentes; proporção da face.

 

Não participaram do estudo indivíduos com barba ou bigode, manchas na pele e deformidades dentofaciais. Os participantes não estavam usando óculos e seus cabelos foram cobertos por toucas padronizadas. “Para adotar o mesmo padrão de dados, o estudo não incluiu pessoas com elementos que interferissem nas medidas”, contextualiza o pesquisador.

 

RESULTADOS – Para analisar a relação entre notas dos subcomponentes faciais e a nota total da face, os dados foram processados por meio de softwares. Adotou-se, para tanto, a análise de regressão múltipla: técnica estatística que verifica a influência de determinadas variáveis em relação à questão analisada. O procedimento é muito utilizado na área de saúde para, por exemplo, prever riscos de desenvolver uma doença associada a determinados fatores.

 

“Essa técnica nos deu o coeficiente que explica o quanto da variável principal – beleza do rosto – podia ser explicada pelas partes. Na vista frontal, o sorriso, por exemplo, é quase 20 vezes mais importante para a beleza do que o nariz”, destaca o dentista.

 

O estudo aponta ainda um padrão das faces avaliadas como mais bonitas, o que inclui rostos mais estreitos, com menor distância interzigomática (marcada pelos ossos da bochecha) e menor largura da bochecha. Outra característica é o queixo mais estreito, com a borda inferior reta e sem papada.

Figura mostra as variáveis morfométricas da face que foram medidas. Imagem cedida
Figura mostra as variáveis morfométricas da face que foram medidas. Imagem: Reprodução 

 

Quanto aos olhos, o padrão foi de maiores distâncias interpalpebral e interpupilar (olhos mais abertos e mais distanciados entre si), e sobrancelhas mais longas. Já o nariz teve como característica bem avaliada a base alar mais estreita. Essas conclusões foram obtidas a partir da correlação entre as notas atribuídas às faces e os dados da análise morfométrica.

 

Outra conclusão importante é a de que os rostos mais belos são os que têm a soma de componentes mais bonitos. “Isso contraria a ideia de que a face deveria ser um conjunto harmônico de combinações. Por exemplo, olhos claros em japoneses não são uma combinação característica dessa etnia. Mas o design do olho oriental somado a linda cor azul produz uma combinação de olhos mais bonitos”, detalha Faber.

 

APLICAÇÕES – O pesquisador ressalta que o estudo pode contribuir para melhor qualidade de vida não apenas de quem tem objetivos estéticos, mas também para pessoas com deformidades resultantes de patologias e acidentes. "Se o paciente teve um acidente de moto e precisa fazer uma reconstrução mandibular, que é um tipo de procedimento relativamente comum, guias podem ser fabricadas com impressão 3D para orientar a execução dessa reconstrução, dando ao indivíduo um formato de mandíbula que seja o mais bonito possível", exemplifica Faber.

 

O dentista cita outros quadros em que a intervenção profissional traz benefícios estéticos e terapêuticos. "Algumas pessoas têm bruxismo muito acentuado, resultando na hipertrofia do masseter (músculo da mandíbula). O tratamento nesse caso traz melhoria para o quadro clínico e pode contribuir para a beleza da face, ao torná-la mais alongada."

 

DISCUSSÕES – Questionados se a amostra de 15 avaliadoras não seria pequena para as conclusões alcançadas, os autores explicam que, apesar de ser uma amostra restrita, “há um crescente corpo de evidências científicas mostrando que a percepção da beleza é inata em sua origem e que existe certa concordância sobre o que é belo”.

 

"Mesmo bebês de poucos meses de idade foram capazes de julgar, com alto índice de concordância, faces classificadas por adultos como belas. Eles despenderam mais tempo olhando para faces bonitas”, argumenta a dentista Carla Karina Carvalho, coautora da pesquisa. Ela reforça que há evidências de que a percepção da beleza é genética, inclusive entre diferentes etnias e idades.

 

Jorge Faber acrescenta que o nível de dispersão das notas dadas às faces dos indivíduos foi baixo. “Isso confirma que as pessoas têm percepções parecidas que revelam certas tendências”, conclui. Ele menciona que cada avaliadora gastou, em média, 50 horas dando notas às fotografias da face e de seus subcomponentes, o que valorizaria a quantidade de informações coletadas e analisadas no estudo.

 

PERSPECTIVAS – A pesquisa integra um projeto guarda-chuva que prevê novas publicações. A previsão é que o próximo artigo detalhe o padrão dos sorrisos apontados como mais bonitos. De antemão, a pesquisadora Carla Carvalho comenta resultados sobre os sorrisos mais belos: canto dos lábios ascendentes, ou seja, cantos mais altos do que o centro ao sorrir – como no estereotipado sorriso da Monalisa (embora a pintura não mostre dentes).

 

Sorriso largo (largura de dentição), borda dos dentes superior e inferior acompanhando o contorno dos lábios, e ausência de espaços entre dentes também são fatores que contribuem para a beleza do sorriso.

 

Um estudo seguinte abordará a análise sobre o outro a partir de atributos faciais. “Atributo é o que a pessoa julga da outra ao olhar sua imagem. Queremos saber quais características da forma facial explicam atributos como aparentar ser bom político, bom pai, honesto, fiel, amigo", explica Faber.

 

O pesquisador reforça que o estudo atual fortalece a importância funcional e estética da odontologia e fornece orientações aos profissionais da área. “Em muitos casos, realizar um tratamento dentário pode produzir um efeito mais positivo sobre a estética do paciente do que procedimentos cirúrgicos como a rinoplastia”, observa. “A intervenção odontológica pode contribuir para a conquista de uma face que seja mais bonita, agradável e que traga maior qualidade de vida.”

 

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